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Um dos capítulos mais importantes da recepção do teatro alemão no Brasil se iniciou em 1958, com a montagem de "A alma boa de Setsuan". A encenação de muitas entre suas obras a partir de então colocou novas questões dramatúrgicas e teóricas num cenário aberto à experimentação estética e marcado pela dialética entre o teatro e o turbulento contexto social brasileiro da época. Grupos como o Arena, o Oficina e o CPC discutiram, atualizaram e articularam a obra de Brecht com suas próprias pesquisas. Como essa recepção, ontem como hoje no Brasil, é feita a partir dos mais diferentes referenciais teóricos e críticos, faz-se necessária a revisitação da crítica esclarecedora de Anatol Rosenfeld sobre Brecht. Profundo conhecedor de estética teatral, da teoria do teatro épico, da obra de Brecht e do teatro brasileiro, Rosenfeld tem papel decisivo em vários debates em torno de sua obra e de sua influência no teatro brasileiro. Nesse artigo, a partir de questões que surgem da recepção contemporânea de Brecht, pretendemos acompanhar algumas etapas desse percurso na obra de Rosenfeld, que é tanto teórico como histórico e crítico e se constitui como um dos mais lúcidos e atuais estudos sobre Brecht e o teatro brasileiro.
O artigo analisa os paralelos entre o retrato do 'sujeito moderno em crise' visto no romance "Die Leiden des jungen Werthers" de Goethe e, por outro lado, o perfil psicossocial do 'homem do sentimento' do século XVIII, fruto da cultura da Empfindsamkeit. Defendo a perspectiva de que, no romance, Goethe não apenas se utiliza do formato literário mais tradicional da Empfindsamkeit (o do romance epistolar), como também se apropria de topói e técnicas discursivas que lhe são próprias em registro radicalmente heterodoxo. A argumentação nos ligará a uma dedução da visão do conceito de subjetividade moderna com que Goethe trabalha em sua fase final do Sturm und Drang, e que o situa como importante nome do discurso filosófico da modernidade.
O artigo apresenta as linhas gerais do desenvolvimento histórico da área de Alemão como Língua Estrangeira (ALE), desde os anos de 1950 até os dias de hoje, focalizando principalmente o processo de sua institucionalização na Alemanha bem como a crescente projeção da área no âmbito internacional, através de medidas de política linguística e cultural do governo alemão e a comercialização de livros didáticos produzidos para o mercado global.
Emancipação tem sido, na teoria crítica da Escola de Frankfurt, o critério normativo último à luz do qual tanto a reconstrução de teorias sociais como a análise de realidades sociais específicas foram avaliadas. Como na Teoria da Ação Comunicativa, de Habermas, houve uma certa restrição ao mundo da vida em detrimento dos subsistemas político-administrativo e econômico, Axel Honneth propôs, em sua Teoria do Reconhecimento, retomar o projeto de uma teoria crítica que analise todas as dimensões da vida social à luz de critérios éticos imanentes, tendo a emancipação como horizonte teleológico. Em seu livro O direito da liberdade: esboço de uma eticidade democrática, lançado em junho de 2011, ele desenvolve uma teoria da justiça que, em distinção à tradição em que se insere o autor, coloca a liberdade como o critério ético nas diferentes esferas da vida. O texto analisa as raízes da obra perguntando-se como a questão da emancipação foi relacionada ao propósito de uma teoria da justiça. Sua atenção está menos voltada para o conteúdo concreto do diagnóstico de época e mais para a proposta metodológica de reconstrução normativa como uma ferramenta para a análise da sociedade.
O objetivo deste trabalho é divulgar e analisar os resultados de uma pesquisa realizada em três instituições paulistanas nas quais se ensina/aprende alemão como língua estrangeira. A pesquisa teve como objetivo geral investigar as crenças que alunos de língua alemã mantêm em relação a seu processo de aprendizagem. O corpus, coletado a partir de questionários e entrevistas, revelou muitas dessas crenças, referentes, por exemplo, à aprendizagem de gramática. Os resultados também apontam para a existência de uma relação entre as crenças e a adoção de determinadas estratégias de aprendizagem. Durante a análise, buscou-se identificar possíveis origens para as crenças detectadas, bem como os efeitos potenciais das mesmas sobre a aprendizagem da língua alemã. No presente artigo, algumas das crenças constatadas no estudo serão descritas e analisadas em relação a pressupostos teóricos e metodológicos da didática de línguas estrangeiras para o ensino de gramática.
Os cursos de línguas a distância vêm ganhando força por se adequarem às demandas sociais contemporâneas e ampliarem as possibilidades de acesso a novos conhecimentos, favorecendo a interação entre pessoas com objetivos semelhantes, mas oriundas de regiões distantes do local no qual os cursos são constituídos e ministrados. Tomando como pressupostos teóricos os estudos de Valente (2002), Garrison e Anderson (2000), entre outros, este trabalho tem como objetivo tecer reflexões acerca dos critérios considerados durante o planejamento e a execução de um curso online voltado para a formação de professores de alemão. Os dados advêm de um curso a distância de extensão universitária, oferecido na plataforma de aprendizagem Moodle de uma universidade do interior de São Paulo, que teve como objetivo levar professores de alemão a um maior desenvolvimento das competências linguísticas, à reflexão sobre aspectos da interculturalidade no ensino da língua-alvo, bem como à vivência com alguns recursos tecnológicos atuais. Serão apresentados os elementos que se mostraram relevantes no planejamento e desenvolvimento do curso, tomando como base autores que discorreram sobre características do ensino mediado pelo computador. A relevância do trabalho encontra-se no fato de que pouco foi encontrado sobre o tema planejamento de cursos para a modalidade online.
Adorno e Kierkegaard
(2013)
Falar da relação entre dois pensadores, um dos quais produziu uma interpretação do outro, significa fazer duas coisas. Por um lado, o expositor precisa examinar essa interpretação, desvendando os pressupostos do intérprete, seus a prioris culturais, seus condicionamentos ideológicos. Por outro, ele precisa investigar em que medida o próprio intérprete foi influenciado em sua obra posterior pelas ideias que ele descobriu no interpretado. É o caso exemplar de Adorno e Kierkegaard. Adorno interpretou Kierkegaard segundo uma óptica marxista muito particular. A tarefa, no caso, é examinar a validade dessa análise. E depois impõe-se fazer o movimento inverso, procurando na obra de Adorno os ecos do pensamento de Kierkegaard. No primeiro caso, Kierkegaard é objeto de interpretação, e no segundo, é fonte para a interpretação da teoria crítica em geral. O autor tentou examinar as duas vertentes dessa dialética.
O artigo propõe traçar a evolução da Teoria do Reconhecimento através da obra de seu autor, Axel Honneth, e apresentar sua recepção no Brasil acompanhada de suas críticas e interpretações. Na primeira parte do artigo é apresentado o conjunto da obra do autor, buscando evidenciar sua evolução interna e os diálogos que Honneth estabelece com seus antecessores. Na segunda parte, discute-se a pertinência, abrangência ou adaptabilidade da Teoria do Reconhecimento a partir de dois pontos principais apontados pelas diversas interpretações da obra do autor: 1) a concepção individualista da autonomia e as suas implicações sobre o entendimento do papel da ação coletiva na luta pelo reconhecimento; 2) as dificuldades de operacionalização teórico-metodológica do seu sistema conceitual em estudos empíricos, e ainda associadas aos parâmetros cívicos europeus, ou mesmo alemães, sobre os quais o autor constrói sua noção de normatividade. Como será desenvolvido, esses temas se encontram articulados entre si e explorados pelos diferentes artigos que compõem o presente dossiê.
Neste artigo, apresentamos uma análise dos processos de diálogo e conflito cultural que influenciam a formação e o deslocamento de identidade das personagens no filme "Bagdá Café". O objetivo principal deste trabalho é analisar o movimento identitário das personagens à luz das teorias culturais de Bakthin e Bhabha. Para tanto, buscamos identificar e descrever os conflitos de cunho cultural neste espaço, caracterizado pela mudança e fluidez.
Honneth, Axel. Das Recht der Freiheit. Berlin: Suhrkamp, 2011.
Em Das Recht der Freiheit, Honneth trabalha mais uma vez os três momentos da esfera do direito objetivo hegeliano com o intuito de mostrar que a liberdade dos indivíduos só é possível nas instituições cujas práticas normativas garantem um reconhecimento recíproco. Essas instituições são a realidade do mundo moderno onde a estrutura da liberdade subjetiva se encontra refletida de maneira objetiva.
Em 1903, Arthur Schnitzler publicou a peça "Reigen" (port. "A ronda"), a qual apresentava dez diálogos, cada qual se desenvolvendo antes e depois de uma conquista sexual. A obra pretende apresentar comportamentos típicos de diferentes classes sociais através da forma como se comportavam para chegar ao mesmo objetivo. A ciranda sexual apresentada no texto causou comoção em sua época e foi criticada por sua alegada imoralidade. Em 1950, a peça foi transposta para o cinema em um filme de Max Ophüls. Sua obra buscou ser fiel ao original, mas também concedeu uma certa leveza ao tema, o que parece indicar um alargamento nos padrões morais diante o sexo. Em 2012, Fernando Meirelles filmou uma releitura da peça de Schnitzler: "360". Na atualidade, uma era marcada pela liberação sexual, o filme não mantém a leveza dada por Ophüls, mas, pelo contrário, é pesado e trata de relações interpessoais através do prisma do sentimento de culpa provocado por traições ou desejos sexuais reprimidos. Neste artigo, será discutido como a temática do desejo e dos impulsos sexuais trazida por Schnitzler se transformou com a passagem de mais de um século, e como a questão da ética foi modelada a cada obra e seu tempo.
O presente ensaio discute a noção de encenação linguística, aplicando-a ao campo de estudos de Alemão como Língua Estrangeira (DaF). Assim, propomos um conceito de encenação da competência linguística, como um procedimento estratégico através do qual a competência científica dos escritores é representada por meio da língua estrangeira. Através da encenação, os escritores demonstram domínio linguístico para formular estruturas complexas, bem como para expressar rotinas e ações de linguagem convencionalizadas no discurso alvo. Defendemos que a Encenação Linguística pode-se manifestar através de estruturas específicas, e através de processos de seleção lexical. Essa conjectura é discutida com base no uso predicativo de sintagmas introduzidos por als, os quais, devido a suas propriedades semânticas e funcionais, podem ser vistos como um recurso de encenação linguística. O corpus é composto de abstracts escritos em alemão por mestrandos e doutorandos brasileiros e de Protocolos de Pensamento em Voz Alta da produção daqueles textos. Os dados apontam uma recorrente dificuldade para completar um plano sintático iniciado por als, assim como para selecionar os verbos adequados para um argumento introduzido por essa partícula. Não obstante, duas estratégias de encenação linguística puderam ser identificadas: a paráfrase e o acesso a conceitos semanticamente concretos antes da ativação de conceitos abstratos.
A racionalização das tradições na modernidade: o diálogo entre Anthony Giddens e Jürgen Habermas
(2013)
Partindo das reflexões de Habermas e sua concepção de modernidade, compreendida como um projeto inacabado, Giddens salienta que, em todas as sociedades, a manutenção da identidade pessoal e sua conexão com identidades sociais mais amplas é um requisito primordial para a segurança ontológica. Para alcançar a segurança ontológica, a modernidade teve que (re)inventar tradições e se afastar de "tradições genuínas", isto é, aqueles valores radicalmente vinculados ao passado pré-moderno. Este é um caráter de descontinuidade da modernidade – a separação entre o que se apresenta como o novo e o que persiste como herança do velho. É sobre a relação entre tradição e modernidade e sobre um diálogo entre Giddens e Habermas que trata este texto. O objetivo é identificar os pontos de contato e as diferenças das teses defendidas por ambos, a fim de avaliar as contribuições de cada um para se pensar a racionalização das sociedades contemporâneas. A modernidade tardia ou reflexiva é um processo de mudanças ininterruptas que afetam as bases da sociedade ocidental. Frente a uma realidade em constante alteração, faz-se necessário escolher entre uma certeza do passado e uma nova realidade, em contínua mutação. Nesse sentido, e segundo a perspectiva habermasiana, o caráter reflexivo da modernidade está nesse processo de escolha entre as certezas herdadas do passado e as novas formas sociais que conduz à reflexão ou, até mesmo, à reformulação das práticas sociais, provocando a racionalização e a (re)invenção de diversos aspectos da vida em sociedade.
O objetivo principal deste artigo é desenvolver uma reflexão a respeito das relações entre a arqueogenealogia das relações entre verdade, poder e discurso, tal como a pratica Michel Foucault, por um lado, e a teoria crítica da sociedade, da Escola de Frankfurt, por outro lado. Essa aproximação é feita por meio de uma reconstrução da crítica de Jürgen Habermas a Michel Foucault, no livro O Discurso Filosófico da Modernidade.
O texto se ocupa com a questão da interpretação da obra de Jean-Jacques Rousseau, em particular com suas referências sobre a dependência constitutiva em relação aos outros. Vista negativamente na crítica da cultura, mas positivamente nos esboços de um contrato social, o lugar dessa dependência constitutiva da confirmação e estima por parte dos outros está vinculada ao significado dado ao “amor próprio” nos diferentes textos; mas ela abre a possibilidade de interpretar Rousseau como um teórico do reconhecimento. O autor acompanha Rousseau em seu desenvolvimento teórico até o ponto em que ele se tornou consciente das exigências de uma forma sociocontratual, igualitária do reconhecimento mútuo, para depois expor a enorme influência que a ideia bipolar de Rousseau a respeito do reconhecimento social exerceu sobre a teoria social da modernidade: em sua variante negativa, a profunda necessidade dos seres humanos de sobrepujar os respectivos cossujeitos no grau de estima social, reinterpretada por Kant como sendo a força motriz do progresso cultural e social, e em sua variante positiva, o respeito mútuo entre iguais, desenvolvido por Fichte e Hegel na direção de uma teoria do reconhecimento relacionada ao direito e à moralidade. No final, Honneth discute o ceticismo com que Rousseau sempre viu a dependência de outros contida no “amor próprio”, deixando sem solução definitiva a tensão entre a ideia estoica de uma independência pessoal de toda avaliação alheia e a ideia intersubjetivista de uma profunda dependência do outro. (Resumo do editor).
Neste texto, analisam-se o conceito de grupo e suas manifestações, buscando contrapor às perspectivas categoriais da psicanálise e da teoria sociológica, consideradas incompletas em razão de estilizações unilaterais que impedem uma conexão conceitual básica entre as duas disciplinas, uma terminologia que, de partida, seja neutra frente às alternativas positiva e negativa de inserção do eu no grupo. Para tanto, o grupo, independentemente de seu tamanho e tipo, inicialmente deve ser compreendido como um mecanismo social fundado na necessidade ou no interesse psíquico do indivíduo, porque o auxilia na estabilidade e ampliação pessoais. O artigo descreve, em linhas gerais, o arcabouço categorial unificado, recorrendo ao conceito do reconhecimento. Num primeiro passo, apresenta-se brevemente a premissa de que a dependência individual de experiências de reconhecimento social explica por que o sujeito individualmente aspira a ser membro em diferentes modelos de agrupamentos sociais. Num segundo passo, tenta-se corrigir a imagem idealizada de grupo anteriormente introduzida, ao tematizar as tendências regressivas que frequentemente codeterminam a vivência no grupo. Por fim, segue-se a ideia de retirar gradativamente aquelas idealizações que estavam na base da premissa inicial de uma diluição harmônica do eu no nós do grupo.