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Johann Nepomuk Nestroy (1801-1862) foi um dos dramaturgos mais importantes da história do teatro da Áustria. Ator e autor aclamado durante seu tempo, é também nome de referência e enorme influência para muitos escritores austríacos canônicos do século XX e do começo do XXI, que até hoje se definem como devedores de sua poética dramatúrgica (por exemplo, Karl Kraus ou Elfriede Jelinek). Este artigo, além de destacar o papel do dramaturgo com "ancestral" para uma parte da literatura austríaca, lança um olhar sobre a única tradução de uma peça de Nestroy disponível no Brasil ("Cacique Vento-da-Tarde ou O festim do horror", publicada em 1990), com o intuito de colocar em questão a visão recorrente da obra de Nestroy como "intraduzível".
Este trabalho tem como objetivo discutir as noções de apropriação pela via da tradução a partir da análise de oito excertos da Preparação à primeira parte da obra "Die Kunst das Clavier zu spielen" de Friedrich Wilhelm Marpurg. A Preparação desta obra compõe-se de 23 parágrafos, dos quais oito refletem ideias apresentadas numa obra anterior, a saber, "L'Art de toucher le clavecin" (1716), de François Couperin. Para este trabalho será considerado o reflexo dessas ideias pela via da tradução. Os trechos traduzidos aparecem ora aumentados, ora reduzidos, ou então são suprimidos. Esta dinâmica de tradução é afirmada por Marpurg no prefácio de duas edições anteriores a 1762: as edições de 1750 e 1751. Investigamos, nas discussões sobre apropriação, o que teria levado Marpurg a abandonar a reverência a Couperin nos prefácios de edições posteriores, o que contribuiu para que essa apropriação - ocorrida também, mas não apenas por meio da tradução - pudesse ser relacionada, a princípio, à autoria. Nesse sentido, apoiados em obras científicas sobre tradução e apropriação, discutimos a noção de tradução, apropriação e autoria, traçando um diálogo com duas áreas dos Estudos da Tradução: análise comparativa e tradução comentada.
A tradução parece trazer dificuldades que exigem soluções diversas que, escolhidas contigencialmente, podem ter implicações históricas e políticas duradouras. A tradução da Bíblia por Lutero é um exemplo marcante da força histórica da tradução e das polêmicas quanto à sua forma. Em "A Tarefa do Tradutor", Benjamin estabelece duas temporalidades distintas para a vida de um texto literário e a de suas traduções, instaurando um debate a respeito dos diferentes tempos históricos que atravessam um texto, em sua relação com as diferentes línguas. A partir dessas considerações, nos propomos a discutir certas dificuldades concretas experienciadas na tradução de citações de uma obra literária dentro de um texto crítico de Benjamin, "Am Kamin", um dos textos em que desenvolve sua teoria do romance. Como traduzir hoje as citações que Benjamin faz do romance "The old wives tale" de Arnold Bennet, citações da tradução para o alemão dos anos 1930, de um texto inglês de 1908 que emula um narrador do início do século XIX, e que não foi ainda traduzido para o português? Por fim, apresento o texto traduzido, "À Lareira".
Este artigo visa a expor as principais questões envolvidas no processo de tradução do alemão para o português do Brasil do livro "Opium für Ovid: Ein Kopfkissenbuch von 22 Frauen" ("Ópio para Ovídio: um Livro do Travesseiro de 22 mulheres"), de Yoko Tawada. Com vistas ao exercício de traduzir, este trabalho deve ser entendido como um estudo preliminar sobre a escritora e seu livro "Ópio para Ovídio", escrito em uma língua estrangeira. Num contexto de constante migração e, ao mesmo tempo, de negação do Outro e de xenofobia, entende-se como necessária a busca por uma experiência de alteridade. Nesse sentido, este trabalho persegue o deslocamento do olhar para uma perspectiva e uma língua estrangeiras, de modo que o texto traduzido propicie uma experiência com o 'fremd'.
Este artigo recapitula as traduções de Wilhelm Busch publicadas no Brasil e aponta que determinadas circunstâncias de publicação levaram a uma recepção unilateral de sua obra exclusivamente como literatura infantil nesse país. Entre outras estratégias que poderiam estender para uma faixa etária adulta o público leitor da poesia humorística buschiana, propõe-se que o Knittelvers seja traduzido para o português como decassílabo iâmbico. Uma tradução anotada do poema "Hänsel und Gretel" nesse padrão métrico-acentual testa em que medida a escolha consciente de um ritmo e o aproveitamento de associações culturais desencadeadas por ele podem destacar o efeito irônico desse pseudoconto-de-fada.
Neste artigo pretendemos apresentar Sigmund Freud e Vilém Flusser não somente como dois intelectuais que dividem certas peculiaridades biográficas, mas como dois importantes pensadores de proposições convergentes. Ambos analisaram criticamente o mal-estar humano face às diferenças individuais e culturais mediadas pelo simbólico e ambos, cada qual ao seu modo, procuraram apresentar maneiras de lidar com tal questão enfatizando as capacidades criativas da linguagem e da tradução em ultrapassar os limites das diferenças, da intolerância e do mal-entendido. Pretendemos, portanto, discutir aqui as contribuições para o entendimento de cada um destes escritores a partir de uma leitura cruzada de suas obras.
Desafios à tradução do texto satírico : alguns exemplos de "Dritte Walpurgisnacht" de Karl Kraus
(2012)
Último texto de fôlego de Kraus, "Dritte Walpurgisnacht" ("Terceira noite de Valpúrgis") foi a reação do satirista à tomada do poder por Hitler. Do ponto de vista tradutório, oferece grande variedade de problemas, visto que o autor faz um uso exuberante de citações, trocadilhos, aliterações, neologismos e variações de ditos, provérbios, máximas e lugarescomuns. Este artigo apresenta alguns desses problemas e discute possibilidades para sua solução, não sem antes definir uma abordagem teórica.
O presente artigo objetiva uma discussão sobre o vocabulário fundamental da Metapsicologia freudiana, para além da concepção de um simples e estanque agrupado de termos técnicos. Levando-se também em consideração o fato de que Freud foi um escritor brilhante e um perspicaz explorador dos recursos oferecidos pela língua alemã, é nossa intenção demonstrar certas distorções de seu estilo e vocabulário sofridas após ter passado por traduces internacionalmente influentes para as línguas inglesa e francesa. Logo, com a recente entrada da obra freudiana para o domínio público, esta finalmente passou a ser traduzida diretamente para o português, tornando-se atualmente um desafio fundamental aos tradutores brasileiros de Freud recuperar a vivacidade de suas palavras sem deixar de levar em consideração a acuidade de suas proposições.
Este trabalho examina os "Escritos sobre a Música e os Músicos", do compositor alemão Robert Schumann, em especial as resenhas escritas entre 1834 e 1836, com vistas a identificar ecos das principais ideias sobre linguagem e tradução desenvolvidas na Alemanha entre o final do séc. XVIII e o início do séc. XIX. Os eixos escolhidos para construir essa ideia são os eixos do sujeito e do tempo perpassados pela noção de movimento. Do primeiro, destacase a ancoragem vertical, personalíssima, operada no interior do sujeito que transita de um sistema sígnico para outro, que traduz seus pensamentos, ou ainda que empreende a passage de uma língua para outra. Do segundo, tem-se em conta a configuração desse mergulho num produto que desmantela as barreiras do tempo e, de um só golpe, contemporiza o passado e inclui o futuro.