Pandaemonium Germanicum Nr. 17
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Mais do que um princípio formal, a noção de ensaísmo de Robert Musil adquire o duplo estatuto de uma "utopia" e de uma atitude diante da realidade. É esse duplo viés que permitirá à arte preservar-se como potência crítica e epistemológica num contexto de crise cultural e de valores na Europa no início do XX. Este artigo aborda a noção de ensaísmo de Musil a partir de seus textos críticos e de seu romance "O homem sem qualidades", demonstrando como as idéias expostas no registro estritamente "ensaístico" se configuram no âmbito da representação poética, consumando assim a "utopia" pretendida pelo autor, de fundar novas relações entre as esferas da razão e do sentimento, da ciência e da arte, da objetividade e da subjetividade.
Sob uma perspectiva crítica, são abordadas neste artigo, imagens sobre a língua alemã e seus falantes, apresentadas por estudantes universitários brasileiros, interessados em aprender esse idioma ou engajados em estágio inicial de sua aprendizagem. O propósito é discutir evidências de imagens estereotipadas, bem como refletir sobre possíveis decorrências dessas imagens no/para o processo de ensino-aprendizagem da língua, buscando, com isso, apontar a importância de se considerar como objetivo relevante no ensino de alemão, a necessidade de um percurso de "desestranhamento" do idioma, por meio de enfoque metodológico orientado para auxiliar os aprendizes no processo de desenvolvimento de competência intercultural. Tais reflexões têm como base pressupostos teóricos como as noções de "outro" e de "próprio", as concepções de competência intercultural e de ensino intercultural, e resultados obtidos em pesquisa desenvolvida no campo de ensino e aprendizagem de língua estrangeira (alemão).
A Universidade de Aachen abrigou durante anos o principal centro de Estudos Imagológicos da Alemanha e talvez do mundo. O centro foi fundado por Hugo Dyserinck, que, em 1966, com o artigo "Zum Problem der 'images' und 'mirages' und ihrer Untersuchung im Rahmen der vergleichenden Literaturwissenschaft" abriu as portas para uma nova Imagologia. Ali reuniu discípulos, que desbravaram os novos horizontes com inúmeras pesquisas, que deram origem à publicação da coleção "Aachener Beiträge zur Komparatistik". No Brasil, a influência de Dyserinck também se fez sentir, por exemplo, na publicação do livro "Do cá e do lá. Introdução à Imagologia", de minha autoria, cujo conteúdo é aqui, em parte, comentado e ilustrado.
A proximidade entre música, filosofia e literatura na tradição alemã e seus métodos de aproveitamento dessas relações marcou profundamente João Guimarães Rosa, possibilitandolhe desenvolver trilhas próprias a partir dos substratos oferecidos pelas cantigas tradicionais brasileiras. Os efeitos gerais das técnicas musicais em "Sagarana", a influência de conceitos da filosofia de Heidegger, a utilização do 'Grundmotiv' wagneriano em "O burrinho pedrês" e "Sarapalha" e as semelhanças entre a narrativa "A hora e vez de Augusto Matraga" e a opera "Parsifal", de Wagner, constituem o objeto desta reflexão.
Este ensaio aborda afinidades entre Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) e Immanuel Kant (1724-1804), principalmente em relação à "Crítica da Faculdade do juízo" kantiana. Investiga-se assim o diálogo teórico que implícita ou explicitamente permeia o texto goethiano e a obra do filósofo de Königsberg envolvendo temas, tais como Arte, Natureza e Sublime.
O artigo analisa a presença sincrônica, na produção acadêmica alemã das últimas décadas, de trabalhos que, em conjunto, podem ser compreendidos como parte de um esforço nãocoordenado de renovação epistemológica e de historicização da episteme artística. Das contribuições de autores diversos são sintetizadas as linhas de constituição daquelas duas grandes problemáticas, que foram distintas, porém convergentes, em seus desdobramentos para a compreensão da arte e da crítica de arte. De um lado, mostra-se a imbricação da renovação epistemológica com novos padrões de percepção do tempo e com o conceito científico de "emergência"; de outro, vê-se como a historicização da episteme artística esteve fortemente dedicada à crítica institucional. Ao longo da apresentação, dá-se destaque ao componente critic daquelas duas formas de historicização, motivadas, como elas foram, pela insatisfação com a condição atual – nas décadas de 1970 e 1980 – da arte e do pensamento.
Neste artigo, abordam-se questões pertinentes às categorias do regional e do universal e ao consequente esvaziamento desta última como critério de qualificação de obras literárias regionais. Na contrapartida, trazem-se contribuições teóricas e metodológicas desenvolvidas no meio acadêmico alemão (SCHEICHEL 1993; STÜBEN 2002; GRYWATSCH 2008), onde a literature regional encontra um espaço privilegiado nos debates, e os critérios de mensuração da qualidade das obras são construídos com base em aspectos sociológicos de produção e recepção dentro dos âmbitos regional e suprarregional.
O presente artigo procura analisar a influência que a escrita literária peculiar e os modos de pensamento contemporâneo em voga no continente americano alcançaram em outros nichos literários tendo, como exemplo específico a Alemanha. Para isso, o foco recairá sobre o romance histórico alemão "Rede des toten Kolumbus am Tag des jüngsten Gerichts" (1992), do autor Hans Christoph Buch. Nele, observa-se como os processos retóricos e estéticos da narrativa se assemelham àquilo que foi considerado como "novo romance histórico latinoamericano", segundo estudos de Aínsa (1988-1991), Menton (1993), Fleck (2007) de outros. Este modelo de produção artística é uma das formas originais do boom literário ocorrido na América Latina, em meados do século XX, demonstrando, assim, como, após muito tempo, as Américas começam a influenciar a escrita de outros continentes e, principalmente, a Europa. Estudos de Lukács, sobre romances históricos, e de Alejo Carpentier e Uslar Pietri (1990), sobre o "Realismo Mágico", também se fazem relevantes, uma vez que as delimitações do gênero literário, além de suas características principais, são passíveis de ser observadas no romance de Buch.
O objetivo deste trabalho é analisar as configurações de história e memória em obras de Christa Wolf, relacionando-as com o período histórico que culminou com a queda do Muro de Berlim em 1989 e consequentemente com o fim do regime socialista na República Democrática Alemã (RDA). Levando em consideração os estudos sobre cultura da memória realizados por Aleida Assmann, pretende-se verificar aspectos concernentes aos limites e funções da memória em algumas obras de Christa Wolf, entre as quais "Was bleibt" e "Leibhaftig".
Entfremdung (alienação) e Fremdheit (estranheza) podem ser entendidos como demarcadores de paradigmas culturais. A primeira está para a modernidade, assim como a segunda está para a pós-modernidade. Uma está para identidade, e a outra para alteridade. Enquanto a existência do fenômeno da alienação tornou-se questionável na atualidade, o discurso sobre estranheza vem se consolidando no âmbito acadêmico europeu. Tal discurso é, em certa medida, marcado por uma crítica cultural que tenta fazer justiça ao "estranho" recalcado por séculos pela cultura europeia. Enquanto isso, uma fenomenologia da alienação começa também a se desenvolver, a fim de reformular o conceito. Os dois fenômenos relacionam-se na medida em que a alienação é entendida como um momento transitório da estranheza. Ambas as teorias têm se mostrado produtivas no campo da análise literária.