830 Literaturen germanischer Sprachen; Deutsche Literatur
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O presente artigo busca investigar como a fotografia, técnica em expansão no início do século 20, se faz presente na escrita de "Contemplação" (1912), de Franz Kafka. A técnica se faz presente em outros textos em prosa do autor, mas em "Contemplação" Kafka incorpora a fotografia à escrita. Em cartas, o autor se refere ao conjunto de prosas curtas publicado em 1912 como um retrato pessoal muito mais fidedigno do que a própria técnica fotográfica seria capaz de produzir. A partir da análise textual da narrativa breve "O passageiro", ao lado das referências de Franz Kafka em seus "Diários e Cartas", desenvolve-se aqui a hipótese de que há uma íntima relação da escrita do autor com a nova técnica de então.
Entre as viagens da escritora austríaca Ida Pfeiffer (1797–1858) esteve uma estadia de cerca de dois meses ao Rio de Janeiro, realizada em 1846. Seu relato dessa experiência no livro "Eine Frau fährt um die Welt", assim como os outros livros do gênero, alimenta um imaginário sobre o Brasil entre seus leitores europeus. Mas, além disso, apresenta vários dos imaginários da autora e de seus conterrâneos acerca do que encontraria no país. O presente artigo busca realizar um levantamento dos trechos em que esses imaginários ficam explícitos no relato da autora, tomando sua obra como uma fonte histórica dos imaginários europeus do século XIX acerca do Brasil.
Este artigo propõe-se a mapear, por meio de seus registros literários, alguns momentos da longa e ambivalente história do processo de integração e assimilação dos judeus à cultura austro-alemã - uma história que se inicia já nos últimos anos do século XVIII, e cujos reflexos literários reverberam século XXI adentro. A contraposição entre uma visão essencialista de cultura e outra fundamentada no conceito alemão de 'Bildung' é o princípio fundamental que opera nos diferentes desdobramentos desta história aqui analisados, e gera dúvidas e perplexidades ainda hoje significativas para o estudo da literatura austro-judaica.
Este dossiê temático - organizado por dois professores universitários brasileiros de nascimento austríaco - cujas contribuições abordam a Áustria e sua literatura no Brasil e no mundo, reune quinze artigos de pesquisadores austríacos, alemães e brasileiros das mais várias áreas de Letras além de Filosofia e de História. A motivação pela sua organização é homenagear a recentemente fundada Coleção Austríaca da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que se entende como ponto de referência em assuntos de cultura, história e literatura austríacas em solo brasileiro e como porta-voz de cursos, eventos, exposições e projetos relacionados às mesmas.
Este trabalho analisa a integração e a construção da narrativa mítica das mulheres Amazonas no primeiro volume da trilogia sul-americana "Amazonas", de Alfred Döblin. Trata-se de um romance ainda pouco conhecido no Brasil, escrito entre 1935 e 1937, quando o autor esteve exilado em Paris. Sob a perspectiva de Jan Assmann em relação às noções de mitomotricidade fundacional e mitomotricidade contrapresente, focalizamos como a narrativa mítica das mulheres Amazonas é incorporada na trilogia e quais significações suscita. Consideramos que o autor opera de duas maneiras no romance: a primeira é a incorporação e funcionamento de certos mitos na representação ficcional da vida dos indígenas; a segunda é a adaptação de mitos na construção da trama ficcional, sendo que o leitor possui uma participação dupla na narrativa mítica: como observador no nível da realidade ficcional e como receptor no nível da narrativa romanesca. Nesse sentido, a mitologia indígena é introduzida no romance de maneira complexa, atua como elemento estético que busca reconfigurar a posição do homem na natureza e tem efeito "contrapresente" sobre os leitores, pois induz a uma reflexão crítica sobre o desenvolvimento da civilização humana e do seu poder destrutivo, sobretudo na primeira metade do século XX.
Em seu último romance, "Die fürchterlichen Tage des schrecklichen Grauens" ("Os pavorosos dias do Espantoso Horror"), Roman Ehrlich apresenta a trajetória de um grupo de pessoas que almeja produzir um filme de terror inovador que retrate todos os medos da atualidade. Ao mesmo tempo que não rejeitam a inspiração dos mais diversos filmes do gênero, incluindo o trash, os envolvidos acreditam poder produzir uma obra vanguardista de destacada qualidade artística. Tão claro quanto o futuro fracasso do projeto, está o jogo de vaidades e inseguranças que movimenta o grupo, assim como a completa ausência das pretensas qualidades artísticas. Com base nas teorias de Andreas Huyssen sobre o pós-moderno, Bourdieu sobre o valor da arte, e Boris Groys sobre o novo, este artigo visa discutir como ambições artísticas mal fundamentadas produzem o efeito de vazio trabalhado no romance de Roman Ehrlich.
Dada a posição excêntrica de Hermann Hesse dentro da literatura de língua alemã no século XX, quase como um "outsider" retrógrado, o objetivo do presente artigo é tentar situar "O lobo da estepe" (1927) nas discussões sobre a "modernidade literária". Para esse fim, serão realizadas considerações que demonstram como o livro representa um sujeito no contexto do mundo moderno dos anos 1920 e como o romance adota uma estrutura multiperspectiva que reflete os novos modos de representação que começaram a ser explorados na forma literária moderna. Essa estrutura será analisada com base nas categorias narratológicas propostas por Genette (1995), apontando as três diferentes perspectivas sobre o protagonista Harry Haller presentes no livro: a do "Prefácio do editor", "As Anotações de Harry Haller" e o "Tratado do lobo da estepe". A partir da análise, discutir-se-á a possibilidade de entender os acontecimentos narrados nas "Anotações”"como frutos da imaginação ou como depoimento autobiográfico do protagonista. No primeiro caso, o livro se encaixaria na categoria do realismo, no segundo, na literatura fantástica. Por fim, serão comparadas as diversas edições do livro - que apresentam diferenças significativas - de modo a evidenciar como a estrutura narrativa pode favorecer a classificação do romance como fantástico.
Abordando o conjunto das chamadas "peças de fala" ("Sprechstücke"), as primeiras quatro obras escritas para o teatro ainda nos anos 60 por Peter Handke, Prêmio Nobel de Literatura de 2019, o ensaio busca localizar nelas mais do que o jogo autorreferencial alienado censurado por muitos num suposto pós-modernismo. Relacionando o projeto do autor com uma tradição modernista propriamente austríaca e com as preocupações de uma possível filosofia política da linguagem, investigamos essa dramaturgia como uma operação crítica em relação a um funcionamento coercitivo da linguagem, para ao fim relacionar esse interesse com sua posição na história do teatro, propondo seu papel chave para compreender a cena contemporânea.
Este trabalho tem como objetivo discutir as noções de apropriação pela via da tradução a partir da análise de oito excertos da Preparação à primeira parte da obra "Die Kunst das Clavier zu spielen" de Friedrich Wilhelm Marpurg. A Preparação desta obra compõe-se de 23 parágrafos, dos quais oito refletem ideias apresentadas numa obra anterior, a saber, "L'Art de toucher le clavecin" (1716), de François Couperin. Para este trabalho será considerado o reflexo dessas ideias pela via da tradução. Os trechos traduzidos aparecem ora aumentados, ora reduzidos, ou então são suprimidos. Esta dinâmica de tradução é afirmada por Marpurg no prefácio de duas edições anteriores a 1762: as edições de 1750 e 1751. Investigamos, nas discussões sobre apropriação, o que teria levado Marpurg a abandonar a reverência a Couperin nos prefácios de edições posteriores, o que contribuiu para que essa apropriação - ocorrida também, mas não apenas por meio da tradução - pudesse ser relacionada, a princípio, à autoria. Nesse sentido, apoiados em obras científicas sobre tradução e apropriação, discutimos a noção de tradução, apropriação e autoria, traçando um diálogo com duas áreas dos Estudos da Tradução: análise comparativa e tradução comentada.