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O artigo busca explorar a temática da 'posthistoire' no romance "Eumeswil", de Ernst Jünger, e numa série de publicações do sociólogo e filósofo Arnold Gehlen. Tentamos evidenciar as surpreendentes afinidades eletivas que existem entre os dois autores, assim como extrair de seus escritos elementos que permitam lançar luz sobre alguns dos dilemas de nossa própria época.
O artigo visa a uma análise comparativa das obras de Ernst Jünger "O trabalhador" e "Nos penhascos de mármore". O objetivo é demonstrar que o conservadorismo do autor abrange essas duas obras, que representam fases distintas: a primeira marcada a busca pela junção do mecânico e do orgânico através do realismo heroico, e a segunda pela busca por uma Ordem transcendente. Assim, se houve, por um lado, uma mudança política do autor, que se afasta definitivamente do horizonte nazista através do caráter alegórico de "Nos penhascos de mármore", por outro lado, sua obra continua ligada a uma ênfase aristocrática e conservadora numa Ordem que determina a vida. Nesse sentido, buscamos as similaridades entre figuras e imagens delineadas pelo autor em "O trabalhador", "Nos penhascos de mármore", assim como outras obras do período do entreguerras.
Este artigo pretende compreender como, para Thomas Mann, a arte é uma forma da moral, e não um instrumento moral. Esta afirmação adquire sentido a partir de seu contexto específico, isto é, a partir do diálogo tenso entre Thomas Mann e seu irmão, Heinrich Mann. Explorando uma possibilidade de análise não feita no estudo de Helmut Koopmann sobre os dois irmãos, pretende-se, neste artigo, comparar "O anjo azul" com "A Morte em Veneza", uma vez que ambas as obras, sendo a primeira uma sátira e a segunda, uma tragédia, têm no problema da forma um elemento central de seu argumento. Neste sentido, a caracterização de Aschenbach como "herói da fraqueza" se distinguirá da caracterização de Unrat como "tirano" a partir da estrutura temporal subjacente à caracterização de ambos os personagens.
Neste ensaio, pretendo empreender uma análise comparativa entre os modos como o intelectual alemão Georg Simmel e o escritor estadunidense Henry James figuram discursivamente aquilo que Simmel chama de "a tragédia da cultura". Em ensaios escritos na virada do século XX, como "As Grandes Cidades e a Vida do Espírito" (1903), "Do Ser da Cultura" (1908) e "O Conceito e a Tragédia da Cultura" (1911), Simmel trata do conceito tipicamente alemão de cultura ('Kultur'), identificando sua dimensão trágica. Conquanto Henry James mostre-se, especialmente no período da 1ª Guerra Mundial, fortemente comprometido com o ideal inglês de "civilização", pode-se notar, em seus relatos de viagem da virada do século, intitulados "The American Scene" (1907), uma compreensão semelhante à de Simmel da moderna experiência da tragédia da cultura.
Este artigo explora a noção de extemporaneidade tomada como um traço distintivo do modelo temporal adotado pelos classicistas de Weimar, por Goethe em particular. Concebe o "extemporâneo" como um preceito e uma prática que supõe um movimento de dissociação do tempo presente e da pessoa do autor. Com base no ensaio "Sansculottismo literário" e na tradução da "Vida" de Benvenuto Cellini, publicadas originalmente no periódico "As Horas" ("Die Horen"), procuro esboçar o elo entre a resposta à Revolução Francesa e a reflexão sobre autoria, e discutir os limites da "extemporaneidade" de Goethe como meio de implementar a autonomia artística.
Ao analisar o drama "Os bandoleiros" (1781), de Friedrich Schiller, este artigo defende a tese segundo a qual o pensamento antropológico desenvolvido à época do iluminismo tardio alemão serve de fundamento não apenas para os discursos médico e historiográfico, mas também para uma parcela significativa da produção literária do período. Para tanto, na primeira seção deste artigo, investigam-se as bases de formação da cultura letrada e, particularmente, da cultura médica alemã na segunda metade do século XVIII, bem como as discussões à época vigentes em torno do conceito de antropologia. Na segunda e na terceira seções, discutem-se as tendências da pesquisa contemporânea que exploram os pontos de contato entre o conhecimento histórico, o pensamento antropológico e a produção literária no século das Luzes. Esses passos fundamentam a tese aqui defendida e segundo a qual o modo de representação literária operado por Schiller em "Os bandoleiros" é expressão direta do projeto de compreensão - em termos antropológicos - das totalidades integradas do homem e da história da humanidade.
Os ensaios reunidos neste dossiê têm o mérito de trazer à tona alguns dos fios que entrelaçam os estudos literários e a teoria da história. O leitor que percorrê-los será confrontado com uma pluralidade de percepções históricas de um núcleo comum de eventos e processos históricos da Modernidade: A Revolução Francesa, o Esclarecimento, as Grandes Guerras, o nacional-socialismo, a indústria cultural e o conceito de progresso. Os ensaios exploram, cada um a seu modo, a linguagem que molda as percepções históricas, desentranhando palavras, discursos e conceitos que as constituem.
A concepção filosófica de Hölderlin compõe-se de duas percepções fundamentais: a indivisibilidade do racional e do sensível presente na ideia platônica de beleza, e a compreensão, de fundo espinosista, de que a unidade assim pensada apreende-se como diferenciada em si mesma. O presente artigo aborda a primeira percepção. Em fins de 1794, Hölderlin abandona o preceptorado na casa dos von Kalb e muda-se para Iena, onde trabalha em seu "Hipérion" e assiste às preleções de Fichte. No entanto ele não chega na cidade de mãos vazias. Numa carta a Christian Neuffer, de outubro de 1794, Hölderlin manifesta a intenção de escrever um ensaio sobre as ideias estéticas de Kant, que deveria servir como comentário do "Fedro", de Platão, ao mesmo tempo que avançaria, mais do que Schiller teria ousado, para além do limite kantiano através de uma simplificação de sua estética. Como o texto jamais foi escrito, o presente trabalho apresenta os elementos articulados na carta e procura reconstituir os marcos gerais do ensaio planejado.
Nos romances do escritor austríaco Thomas Bernhard, a morte de alguém próximo ao narrador serve de motivo para que este inicie o relato de suas memórias. Nossa proposta é verificar como o estatuto da morte configura o espaço literário de duas obras de Bernhard, a saber, "O náufrago" (1983) e "Árvores abatidas - uma provocação" (1984). Considerando que, nesses romances, a morte se dá pela via do suicídio, utilizaremos como fundamentação teórica o "Seminário 10 - A angústia", livro em que Jacques Lacan aponta o suicídio (ou passagem ao ato) como uma forma encontrada pelo sujeito para sair de uma cena a qual ele não conseguiria mais sustentar pela palavra. Desse modo, abordaremos como o contato com a morte reverbera na subjetividade do narrador, já que a morte também é responsável por seu retorno à Áustria, país de onde ele sempre tentara se desvencilhar.
Concebido para suprir as lacunas de uma existência que se tornara pública e notória com a publicação do "Werther", o relato autobiográfico de "Dichtung und Wahrheit" dedicará boa parte das quase 300 páginas de seus sete últimos livros à narração das circunstâncias que teriam possibilitado a Goethe encontrar um campo de atuação e influência compatíveis com a estrondosa repercussão do "Werther", mas ao mesmo tempo condizentes com uma vocação poética a que Goethe recusa qualquer interferência direta e 'didática' nos assuntos humanos, visto como passa a concebê-la 'inteiramente como natureza'. O artigo se propõe passar em revista esse momento decisivo de elaboração da 'Bildung' goethiana compreendido sobretudo nos livros 13 a 16, o qual coincide com a definição dos fundamentos da vocação poética que marcará a fisionomia espiritual da produção de Goethe vida afora. Para tanto, investigará a pertinência do conceito de teleologia como princípio explicativo oportuno à elucidação do referido momento, à luz da discussão proposta por Fotis Jannidis (1996); e analisará o papel das referências e influências que maior importância tiveram para Goethe nesse processo: Lavater, Basedow e Zimmermann, entre os convivas, Spinoza e Prometeu entre os luminares.
Neste artigo, trazemos algumas reflexões a respeito da influência exercida por línguas anteriormente aprendidas no processo de aprendizagem de alemão como L3 por aprendizes brasileiros. Essas influências podem operar tanto por meio de transferências linguísticas intencionais, controladas pelos próprios aprendizes, quanto por transferências não intencionais. Dependendo do referencial teórico adotado, essas transferências intencionais são consideradas estratégias de aprendizagem e/ou de comunicação. Com base em uma pesquisa empírica realizada em 2017 e em alguns debates na área acadêmica em torno do assunto (OXFORD 1990, 2011; BIMMEL e RAMPILLON 2000; SELINKER 1972, 2014; HUFEISEN 2010), este artigo tem como objetivo analisar as estratégias utilizadas por aprendizes de alemão como L3 em um chat online e refletir sobre as influências interlinguais exercidas sobre os aprendizes de forma não intencional. Os resultados obtidos apontam para contrastes (1) quanto ao tipo de estratégias utilizadas por aprendizes em diferentes níveis de aprendizagem e (2) quanto à língua da qual decorreram as influências não intencionais: aprendizes mais proficientes utilizaram estratégias que mobilizaram mais elementos da língua-alvo, como os circunlóquios, e não sofreram nenhuma influência exclusivamente da língua materna (apenas da L1 e da L2 concomitantemente ou apenas da L2), ao contrário de aprendizes menos proficientes.
A estrutura silábica do alemão como língua estrangeira na interlíngua de aprendizes brasileiros
(2019)
A presente pesquisa explora as estratégias de reformulação de constituintes silábicos complexos na Interlíngua de 18 brasileiros aprendizes do Alemão como Língua Estrangeira. Nossa hipótese prevê que estes aprendizes possuem dificuldades na produção de ataques iniciais e codas finais do ALE e, ao tentar acomodá-las ao molde silábico da LM, aplicam diferentes estratégias de reparação. A partir do conceito de Interlíngua (SELINKER 1972) como língua natural, sistemática e emergente de um processo complexo e dinâmico, desenvolvida autonomamente por falantes não-nativos de uma LE em seu processo de aquisição/aprendizagem com o objetivo de comunicar-se estrategicamente, e que sofre adaptações a partir da testagem de hipóteses acerca da LE e eventos de interação, realizamos análise transversal das ocorrências de ataque e coda complexas em correlação com o nível de proficiência do aprendiz, o estilo (LIN 2001, 2003) e a marcação do constituinte (GRENNBERG 1966b). Os dados revelaram que a frequência de modificação de clusters apresenta correlação com estes fatores: quanto mais formal a tarefa e avançado o aprendiz, menos modificações ocorrem. A influência da marcação silábica e dos universais linguísticos foi constatada para a coda, tipologicamente marcada, sendo mais frequentemente modificada que o ataque.
Partindo de considerações sobre os escritos precoces que Benjamin dedicou à questão da linguagem - sem descuidar de outros escritos do mesmo período -, pretendemos sugerir a importância que a reflexão de Kant teve para a formulação de seu pensamento linguístico. Nesse sentido, voltamo-nos principalmente para a Segunda Parte da "Crítica da Faculdade de Juízo", na qual é desenvolvido e trabalhado o importante conceito de "Zweckmässigkeit" ("conformidade a fins"), sobretudo a partir de uma reflexão sobre a perfeição da natureza, em sua dimensão teleológica. Benjamin retoma esse conceito e - elaborando uma série de imagens sobre a dimensão natural da linguagem, na linha do que propunha um pensador como Humboldt - desenvolve uma filosofia da linguagem a um só tempo natural e teológica. Depois de demonstrar textualmente a existência dessa relação entre a Faculdade do Juízo Teleológica de Kant e a filosofia da linguagem do jovem Benjamin, pretendemos sugerir que este último cede àquilo que o filósofo de Königsberg considerava a ilusão natural da razão, pois, ao postular uma "afinidade meta-histórica entre as línguas", fundamentada no conceito suprassensível de "die reine Sprache" ("a língua pura"), Benjamin aborda algo que escapa à possibilidade de experiência humana e propõe desdobramentos dogmáticos a partir daí.
A tradução parece trazer dificuldades que exigem soluções diversas que, escolhidas contigencialmente, podem ter implicações históricas e políticas duradouras. A tradução da Bíblia por Lutero é um exemplo marcante da força histórica da tradução e das polêmicas quanto à sua forma. Em "A Tarefa do Tradutor", Benjamin estabelece duas temporalidades distintas para a vida de um texto literário e a de suas traduções, instaurando um debate a respeito dos diferentes tempos históricos que atravessam um texto, em sua relação com as diferentes línguas. A partir dessas considerações, nos propomos a discutir certas dificuldades concretas experienciadas na tradução de citações de uma obra literária dentro de um texto crítico de Benjamin, "Am Kamin", um dos textos em que desenvolve sua teoria do romance. Como traduzir hoje as citações que Benjamin faz do romance "The old wives tale" de Arnold Bennet, citações da tradução para o alemão dos anos 1930, de um texto inglês de 1908 que emula um narrador do início do século XIX, e que não foi ainda traduzido para o português? Por fim, apresento o texto traduzido, "À Lareira".
Este artigo visa a expor as principais questões envolvidas no processo de tradução do alemão para o português do Brasil do livro "Opium für Ovid: Ein Kopfkissenbuch von 22 Frauen" ("Ópio para Ovídio: um Livro do Travesseiro de 22 mulheres"), de Yoko Tawada. Com vistas ao exercício de traduzir, este trabalho deve ser entendido como um estudo preliminar sobre a escritora e seu livro "Ópio para Ovídio", escrito em uma língua estrangeira. Num contexto de constante migração e, ao mesmo tempo, de negação do Outro e de xenofobia, entende-se como necessária a busca por uma experiência de alteridade. Nesse sentido, este trabalho persegue o deslocamento do olhar para uma perspectiva e uma língua estrangeiras, de modo que o texto traduzido propicie uma experiência com o 'fremd'.
Este artigo tem como objetivo apresentar e discutir a tradução do texto "Die Lesung" (In: HELMINGER, Guy, 2001, p. 84 a 95), que esteve dentre os contos traduzidos pela autora na prática de "Estágio Supervisionado do Alemão I". Guy Helminger, o escritor traduzido, é luxemburguês de nascença e cosmopolita de profissão. De suas viagens e estadas pelo mundo, publicou, entre outras obras, "Die Allee der Zähne: Aufzeichnungen und Fotos aus Iran" (2018) e "Die Lehmbauten des Lichts: Aufzeichnungen und Fotos aus dem Jemen" (2019). "Rost", um de seus livros de contos, teve a primeira edição publicada em 2001, agraciada pelo Prix Servais em 2002, e a reedição publicada em 2016 (CAPYBARABOOKS e CONTER E JACOBY (200[2?])). "Die Lesung" ("A sessão de leitura") compõe a segunda parte do livro, que é dividido em três. O conto narra em onze agoniantes páginas as peripécias enfrentadas por Robert Fritzen em uma sessão de 'leitura de obra pelo próprio autor'. Impressionado pelo estofamento das cadeiras ou distraído por tossidas e fios de cabelo, Fritzen é engolido por neuras. Se o texto deve qualquer parte do seu valor estético à irritação que pode/tenta causar no leitor, traduzi-lo esteve, pelo contrário, longe de ser irritante: Helminger apresenta um texto desfrutável, mesmo sem contar com nenhum acontecimento trágico (como nos demais textos do livro). Dentre as dificuldades de tradução, se destaca o desfio de manter a linguagem realista, como caracteriza Weidner (2002), na descrição de eventos que beiram o surrealismo - ou a loucura.
A representação da imigração alemã em "A Ferro e Fogo: I. Tempo de Solidão", de Josué Guimarães
(2020)
O presente artigo tem como objetivo analisar a representação da imigração alemã no romance "A ferro e Fogo: I. Tempo de Solidão", de Josué Guimarães. A narrativa ficcional acontece nos primeiros anos da imigração alemã no sul do Brasil (1825). A análise está pautada em três pontos: a relação de imigrantes alemães com outros grupos étnicos (a saber, negros escravizados, índios e castelhanos), a representação da mulher na narrativa (principalmente em relação ao poder de dominação e às diferenças étnicas) e, por último, as questões políticas e religiosas. Imigrantes alemães eram obrigados ou simplesmente destinados a um lado político, a uma determinada religião. Pelo posicionamento político, acabavam destinados à frente de batalhas em guerras. Na obra de Josué Guimarães podemos ver os dois lados da imigração alemã: a chegada sofrida com inúmeras dificuldades enfrentadas pelos imigrantes e também o aproveitamento que muitos fizeram da política governamental de embranquecimento da população brasileira. Através desta análise procura-se entender também o papel do descendente de imigrantes alemães na contemporaneidade.
O foco do presente artigo é a análise do romance "Die Liebhaberinnen" ("As amantes", 1975), de Elfriede Jelinek. Com vasta obra que transita por diversos gêneros (poesia, romances, ensaios, peças teatrais, libretos), a escritora austríaca ainda é pouco traduzida no Brasil. Contudo, a despeito disso, notamos uma presença signficativa de trabalhos acadêmicos sobre os escritos de Jelinek. Único prêmio Nobel austríaco (entre uma longa lista de outros prêmios literários), concedido a uma mulher, figurando dentre outras dezesseis agraciadas, a escritora segue execrada pela mídia. Parte da geração que adere ao 'Anti-Heimat Roman' (romance anti-pátria), sua veia ácida, a ironia com que costura as narrativas a faz compartilhar da herança literária de nomes como Karl Kraus e Thomas Bernhard. A obra em questão repete o formato encontrado em outros textos jelinekianos - a história descortina-se a partir de tensões. O plano crítico da narração denuncia a pequenez de existências que seguem insensíveis na direção de destinos previsíveis e que atendam às forças conservadoras e patriarcais. No projeto estético de Jelinek, a língua alemã é um elemento de transgressão, como na grafia de substantivos em letras minúsculas, o uso de aforismos e repetições. Em comunhão com essa língua que questiona o status de um narrador patriarcal, a voz que narra distancia-se do narrado, paira sobre o texto, fria e indiferente. Os personagens aproximam-se de tipos, joguetes sobre um tabuleiro determinista. Da leitura do romance, destacamos a estrutura binária sexista e generificada que perpassa toda a obra, resultando numa permanente disputa entre homens e mulheres, inimigos irredutíveis, cada qual vigilante por seu espaço doméstico e pela manutenção das vantagens inerentes a seus papéis sociais. Essa dicotomia problematiza questões que configuram o arcabouço de influências estéticas e ideológicas da autora, tais como o feminismo, o marxismo e os movimentos de 1968. Nesse sentido, acreditamos no potencial transgressor e demolidor que perpassa a obra, a ponto de configurar uma estética feminista própria.
Mais de duzentos anos após sua primeira publicação, a obra "Os Sofrimentos do Jovem Werther" é ainda capaz de despertar sentimentos e opiniões diversas, muitas vezes conflitantes, ao tratarmos do jovem que morreu de amor na recusa de uma vida marcada por privações, que o impediam de concretizar um desejo tão genuíno. O romance epistolar do então jovem escritor Johann Wolfgang von Goethe hoje conta com algumas releituras, paródias e três adaptações para o cinema. Sabemos, certamente, que "Werther" foi responsável por consolidar, na literatura, uma revolução, lançando para o mundo umas das manifestações artísticas nacionais e autênticas do povo germânico, que já não se pautava nos clássicos moldes importados da França, como já nos apontava a Dramaturgia de Hamburgo, de Lessing. Seja por sua enorme repercussão, em escala global, seja pela trama memorável, guiada pelo sentimentalismo exacerbado de seu protagonista, a produção é, por vezes, relembrada como ponto de virada para o início do Romantismo na Europa, sendo denominada por parte do público e crítica como "pré-romântica". No entanto, a partir de sua integração em um contexto artístico-literário exclusivamente alemão, o Sturm und Drang, essa obra será analisada tanto em sua relação intrínseca com os preceitos adotados por muitos artistas do período, quanto em uma possibilidade de leitura outra, que se abre a partir daí: a construção de um caráter crítico às configurações sociais da época, feita por Goethe, logo em seu primeiro trabalho de grande sucesso. Veremos que, utilizando-se das características dominantes do movimento referido, isto é, a expressão dos sentidos, das paixões, das emoções consolidadas no espírito libertário da segunda metade do século XVIII, a narrativa pode então direcionar-se para o questionamento daquilo que retrata, especialmente a figurativização de Werther como herói ideal e revolucionário, dadas as circunstâncias sobre as quais a diegese se constrói, como a focalização e voz narrativa que gradativamente postulam o caráter dúbio e contraditório do protagonista através do romance.
O artigo traz um estudo das vanguardas, tais como elas foram apresentadas ao leitor brasileiro por algumas das primeiras histórias da literatura alemã escritas em língua portuguesa. Três histórias brasileiras da literatura alemã (KOHNEN, 1948; CARPEAUX, 1967; ROSENFELD, 1993) são confrontadas com definições teóricas e textos historiográficos mais recentes, levando-se em consideração tópicos referentes às vanguardas, como origens, período de vigência, características inerentes e autores relevantes. De 1948 até cerca de 1970, período em que as três histórias foram escritas, percebe-se um crescimento na valorização das vanguardas e uma maior complexidade em sua apresentação. O fato pode ser atribuído a um desenvolvimento dos estudos de língua e literatura alemã no Brasil da década de 1960, bem como à formação mais ampla dos historiadores, que é visível em suas produções e biografias.
O texto investiga os sentidos do isolamento na lírica de Mascha Kaléko. Interessa à abordagem em particular os significados sociais no tratamento do tema da solidão em algumas composições reunidas no título "Das lyrische Stenogrammheft", de 1933. O trânsito entre vida pública e privada, assim como as articulações daí resultantes, que tensionam os conflitos individuais no contexto da cidade moderna, organizam, aqui, os critérios de aproximação aos poemas. O objetivo é reconhecer na poesia da autora uma possibilidade de relacionar de maneira produtiva o momento presente e o potencial interpretativo implicado na representação da experiência da metrópole, partindo de Berlim, na República de Weimar.
O modo como a mídia representa migrantes e refugiados desempenha um papel importante na percepção e recepção desse grupo em seu novo país (Ferreira/ Flister, 2019). Este estudo visa a problematizar o olhar da mídia online sobre imigração e refúgio no quadro de uma discussão sobre o tema a partir de uma perspectiva teórica da linguística cognitiva, por meio da análise de metáforas conceituais utilizadas por dois jornais online (um brasileiro e outro alemão) em torno da conceitualização do termo 'refúgio' ('Flucht' em alemão). Este estudo foi desenvolvido com apoio de metodologia da linguística de corpus. Nosso objetivo é contrastar os usos linguísticos em dois contextos culturais e pragmáticos distintos, i.e. a cultura brasileira e a cultura alemã respectivamente, por meio da análise de mapeamentos metafóricos sobre refúgio e imigração na mídia online através de enquadramentos metafóricos presentes nesses jornais. Algumas questões que pretendemos responder são: Que frames e que metáforas surgem na mídia online brasileira e alemã, a exemplo dos jornais online "Folha de São Paulo" (FSP), no Brasil, e o jornal online "Frankfurter Allgemeine Online" (FaZ) na Alemanha, para representar o conceito refúgio? Quais são suas implicações? Os resultados apontaram o uso de frames e metáforas do domínio experiencial DESASTRES/ FENÔMENOS NATURAIS com conotação negativa como 'ondas de imigração', 'avalanche imigratória', 'Flüchtlingsströme' ('correntes de refugiados') e 'Flüchtlingsbestie' ('monstro refugiado').
Este artigo tem como objetivo propor a elaboração de uma unidade didática (UD) para a aula de língua alemã em uma turma de 8º ano do Ensino Fundamental, levando em consideração a realidade de uma escola pública de Porto Alegre/RS e tendo como ferramenta principal o gênero textual história em quadrinhos. Para alcançar tal objetivo, primeiramente busca-se entender o conceito de letramento relacionado à escola contemporânea - com base nos estudos bakhtinianos, bem como nos de Magda Soares (2004; 2009) e de Angela Kleiman (2008; 2014) -, a fim de compreender qual é o papel da escola na formação de sujeitos letrados que sejam capazes de participar do mundo e de se expressar nas diversas situações do dia a dia. Também é apresentada uma escola da rede pública de Porto Alegre que oferece a língua alemã em seu currículo, a fim de entender de que forma o ensino do alemão vem sendo abordado. A partir dessa realidade local, a UD foi produzida seguindo os princípios de ensino-aprendizagem de língua adicional de Schlatter e Garcez (2012) e apoiando-se no modelo de UD apresentado pelo documento "Lições do Rio Grande", que são os referenciais curriculares lançados pela Secretaria de Educação do Estado do Rio Grande do Sul em 2009.
A "Revista Contingentia", Revista do Setor de Alemão da UFRGS em parceria com a UFPel, publica artigos tanto da Linguística como da Literatura, com o objetivo de oferecer uma maior visibilidade ao leitor brasileiro acerca das produções teóricas relacionadas à Germanística desenvolvidas no meio acadêmico brasileiro e internacional. Além disso, a "Revista Contingentia" seleciona artigos voltados para os estudos da tradução, assim como aspectos linguísticos e pedagógicos do ensino de alemão como língua estrangeira (DaF). Ela também publica traduções comentadas e oferece espaço para resenhas. O presente número é de temática livre.
Friedrich Dürrenmatt (1921-1990) consolidou-se como um dos nomes mais célebres da dramaturgia suíça com obras como "Der Besuch der alten Dame" (1956) e "Die Physiker" (1962). Nestas duas peças, por exemplo, é possível perceber a condição turva que o conceito de culpa possui aos olhos do dramaturgo. A representação deste e de outros conceitos como a inocência, responsabilidade, arrependimento, justiça e liberdade, assim como suas relações, não é mais vista em termos absolutos nas obras do suíço, sendo agora permeadas pela comédia. Apenas com a comédia é possível dar forma concreta e concisa ao trágico, "configurar aquilo que é caótico", como escreve o autor em seu "Theaterprobleme", em 1955. O tragicômico permeia também os textos em prosa de Dürrenmatt. As diluições das relações de poder podem ser vistas nas obras "Die Panne" (1956) e "Das Versprechen" (1958), escritas entre suas duas peças teatrais mais conhecidas. Ainda que não inéditas em língua portuguesa ("A pane" já havia sido publicada no Brasil em 1964 com tradução de Stella Altenbernd pela Editora Globo e "A promessa" em 1961 com tradução de Mário da Silva pela editora Civilização Brasileira), ambos os textos foram reunidos em 2018 pela TAG, com traduções de Marcelo Rondinelli e Petê Rissatti, respectivamente.
A encenação autoral de Christian Kracht: o caso d' "Os Mortos" de Kracht, de Joyce e de Huston
(2019)
Partimos do pressuposto que os escritores, ao longo da história, sempre se utilizaram de estratégias encenatórias tanto em relação às suas obras como às suas figuras públicas, e de que o fazem não só para se estabelecer no campo literário, mas para o fazê-lo de um modo específico (JÜRGENSEN; KAYSER, 2011; BOURDIEU, 2000). Tendo em vista o último romance de Christian Kracht, "Die Toten" (2016), cujo título pode ser livremente traduzido como "Os Mortos", e as relações intertextuais que podem ser estabelecidas com o conto homônimo de James Joyce (1914) e sua adaptação para o cinema dirigida por John Huston (1987), temos por objetivo investigar de que modo essas relações contribuem para a encenação de Christian Kracht e para seu posicionamento no campo literário.
Este artigo reavalia a fase literária pop do escritor suíço Christian Kracht em relação aos seus últimos dois romances históricos. A superfície, ou até a superficialidade, talvez explique a ênfase da literatura pop dos anos 1990 em labels, servindo apenas como enumeração de elementos concretos, sem jamais entrar no abstrato. Argumentamos, quando nos referimos a Christian Kracht, que ele abandona tais tendências com seus últimos dois romances, "Imperium", de 2012, e "Os mortos", de 2017, sem, entretanto, renunciar à ambivalência entre o superficial e o profundo, pois ele foge habilmente de qualquer posição unívoca, tanto na forma narrativa em seus romances, quanto na forma extraliterária em entrevistas ou informações biográficas. Em virtude disso, há incertezas e ambiguidades quanto a um suposto "núcleo" autêntico ou verdadeiro de sua obra, sendo impossível distinguir claramente entre a teatralidade ficcional e a não-ficcional.
Ao desconstruímos, neste ensaio, o conceito Monstruosidade apresentamos as pretensões dos "níveis de malevolência" nos estereótipos da feiura advindos de personificações tais como o Golem, o Ciclope ou as personagens bestiais made in Hollywood - em sua maioria, discursos preconceituosos contra a Alteridade. Dito isso, o problema do mal será considerado aqui a partir da condição de inescapabilidade em face de imensos acontecimentos, dentro dos quais o homem se encontra implicado - disso conceituamos Monstruosidade em correlação com o Mal e o Inescapável. Assim, este texto objetiva investigar tal conceito na imanência dos acontecimentos de "A Metamorfose", de Franz Kafka. Para isso, nossas hipóteses são: a) a Monstruosidade se configura tanto mais quanto maior for à inescapabilidade dos fatos nos quais os homens são vitimados; b) o homem não é monstro nem algoz em si, mesmo que se revista de fealdade de aparência; c) o Mal se constitui através dos acontecimentos caudalosos e sequenciados da história humana nos quais os homens se engajam; d) inocência e culpa se constituem em arbitrariedades no regime de monstruosidade. Assim, efetuamos uma pesquisa textual de cunho filosófico e literário, sobre o texto de Kafka em busca destas questões.
Este artigo tem o intuito de investigar conceitos atuais que designam a escrita de autores migrantes, sobretudo, os refugiados cuja escrita ultrapassa os limites biográficos e nacionais, ausente a possibilidade de alocação de suas escritas em qualquer classificatória. Apesar de esforços ao longo da história dos estudos literários de desagregar os escritos desses autores à sua origem, na tentativa de retirar um crivo nacional, vê-se em historiografias literárias recentes certo apego ao ideário constitutivo da nação na denominação das literaturas escritas por migrantes. Como exemplo dos escritores outrora refugiados na Alemanha e sua recente produção, este artigo propõe a ideia mundialização desses escritos, em uma espécie de nova 'Weltliteratur'.
A arte tem lugar fundamental para pensarmos cultura e sociedade. Assim, a literatura é tratada aqui como discurso social que pode ser debatido. Discutiremos o ensino de Literatura em LE em diálogo com práticas de Letramento literário em Língua Materna (LM). Para tanto, abandona-se a abordagem centrada na competência linguística do aluno em LE. Inicia-se pela ativação/construção de um repertório prévio em LM, que será base para a leitura em LE. Dessa forma, é possível preservar a potencialidade da leitura de literatura, entendida como medium de construção de um universo histórico-cultural e posicionamento crítico do sujeito. Como exemplo, apresentaremos uma proposta de aproximação pedagógica e intercultural com romances do gênero discursivo 'Bildungsroman'.
O objetivo deste artigo é trazer os primeiros resultados oriundos de nossas pesquisas relativas às relações de intercompreensão entre o Hunsrückisch e o alemão standard. Estamos investigando os graus de inteligibilidade que falantes de Hunsrückisch apresentam quando confrontados com o alemão standard em modalidade oral, em um primeiro momento, com o objetivo de registrar as relações tipológicas entre essas variedades. Como previsto em nossas hipóteses iniciais, até mesmo pelo grau de parentesco muito estreito entre as línguas, os primeiros resultados indicam que o Hunsrückisch pode ser considerado muito próximo ao alemão standard, já que o número de itens não entendidos foi baixo. Esses resultados ainda não são conclusivos, e os próximos passos da pesquisa também serão apresentados no fim deste artigo.
Contrariamente ao que se possa supor, a concepção de 'literatura menor', tal como nos é apresentada por Deleuze & Guattari (2013), não contempla uma forma literária de menos prestígio. 'Menor' é a literatura que emerge com força de potência capaz de abalar as estruturas de um modelo literário imposto como maior. Nesse sentido, atribuir a Kafka uma leitura que perpasse essa perspectiva é reconhecer o carácter de desterritorialização de seus feitos. A relação do autor com a língua é uma forma interessante de ilustrar isso: na impossibilidade de escrever em outra língua que não fosse o alemão, conforme posto aos judeus de Praga, o que resulta é uma língua desterritorializada, tão política quanto o modelo literário que essa produz. Além do mais, as personagens que transitam pelo universo kafkiano nos dão pistas do compromisso com o social, tão presente no que é literário e 'menor', seja pela denúncia ao excesso de burocracia que pune cidadãos comuns, seja pela figura paterna constantemente representada como autoritária. Nessa continuidade, há ainda a menção à relação conflituosa que o autor manteve com seu pai, a qual lhe rendeu uma carta, publicada no ano de 1919, sob o título "Brief an den Vater" ["Carta ao pai"], e cujo intuito era tornar o pai ciente do peso negativo de suas ações sobre a vida dos filhos. Essa obra norteará nosso trabalho, enquanto objeto de análise, sobretudo porque a partir dela podemos enxergar a transição do autor de Édipo neurótico a Édipo perverso, em consonância com as contribuições de Lacan, além da riqueza de elementos contida nela, que nos permite desenvolver sobre a homofonia entre o 'Nom du Père'/'Non du Père',a representação do "não" do pai foucaultiano.
Yoko Tawada é um dos nomes mais importantes da Literatura Contemporânea. Seu projeto literário trata das questões acerca da identidade através do processo de estranhamento. Em "Das nackte Auge" tem-se uma jovem garota vietnamita, cujo nome nunca é revelado, que, por conta de um engano, desembarca na cidade de Paris. Ela não fala francês e se vê incapaz de compreender o meio estrangeiro que a cerca. No entanto, encontra no cinema, mais especificamente nas personagens de Catherine Deneuve, um local de refúgio e identificação. Cada capítulo trata de um filme cuja narrativa progressivamente se mistura e influencia a narrativa da personagem. Já no primeiro capítulo, "Repulsion", uma referência ao filme de Roman Polanski, pode-se perceber diversos elementos comuns à obra fílmica e de fundamental importância na construção de "Das nackte Auge". Tal construção intermidiática é apresentada com o objetivo de suscitar questões acerca do sujeito contemporâneo e seu olhar (desnudado) sobre o estranho, o estrangeiro.
Experiências migrantes, embora distintas, são geralmente acompanhadas de uma sensação de exílio e ainda que seja comum pensar o exílio como uma condição político-geográfica, na qual o sujeito é ou se vê obrigado a permanecer distante do seu lar e das suas origens, ele pode, na verdade, assumir outras formas. Entre estas, é possível citar o exílio físico - quando o sujeito, independente da sua localização espacial, sente-se exilado em função do seu gênero ou da sua etnia, por exemplo. Outra forma de exílio é o exílio linguístico - quando o sujeito se encontra em uma situação na qual escolhe - ou, por alguma razão, precisa - produzir e se comunicar em uma língua que não a sua primeira. Comum a todas as formas de exílio está a estreita ligação que estabelecem com a noção de hospitalidade e também com a noção de exofonia, que se relaciona à escrita de autores que vêm de todas as partes do mundo e, ao mesmo tempo, não pertencem a lugar nenhum e que são levados a escrever em outras línguas, além da sua primeira. A escrita exofônica evidencia um deslocamento que é sim político e geográfico, mas é ainda ‒ ou ainda mais que isso ‒ linguístico, textual, identitário, inserindo esses autores no que Ottmar Ette (2005) denomina literatura sem morada fixa ['Literatur ohne festen Wohnsitz']. A partir da análise do conto "Ein Gast" ["Um hóspede"] - obra de Yoko Tawada, na qual a protagonista japonesa vivencia uma série de estranhamentos em relação ao outro alemão, evidenciando o caráter central das noções de exílio e hospitalidade -, serão analisadas e discutidas a íntima relação entre essas noções bem como a centralidade do papel que a exofonia desempenha nessa dinâmica. Essa análise será realizada com base as reflexões teóricas de Jacques Derrida e da própria Yoko Tawada, entre outras.
A emancipação do indivíduo (e, mais precisamente de um tipo específico de indivíduo, a saber, o "burguês") é o principal ponto de convergência entre duas obras da literatura europeia setecentista (seja insular, britânica, seja continental, alemã). São elas: "Robinson Crusoé" (1719), de Daniel Defoe, e "Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister" (1795-1796), de Johann Wolfgang von Goethe. Em seu cerne, ambas enfocam a formação do indivíduo por meio do deslocamento geográfico, dizendo respeito não apenas a um processo de desenvolvimento pessoal, interno, mas também a uma dimensão sócio-cultural mais ampla, englobando os avanços da industrialização e as aspirações da sociedade de seu tempo. Juntos, o romance de formação ou "pedagógico" ('Bildungsroman'), bem como a viagem de formação ('Bildungsreisen') se entrecruzam em um ponto onde o sujeito burguês busca se afirmar em uma sociedade cada vez mais competitiva, desigual, em que o o indivíduo precisa descobrir a si mesmo (saindo de seu meio, ressalte-se), na busca do alcance de uma formação pessoal - seja para se coadunar com o que a nova sociedade industrial em ascensão espera dele ou para conseguir se opor aos valores dela. Tal tensão, no caso de Goethe, é evidenciada por meio da oposição do protagonista, Wilhelm (o burguês que busca seguir as próprias aptidões, independentemente do desejo de acúmulo de bens, apoiando-se em uma "ilha humanista" representada por uma sociedade secreta) ou o personagem Werner, o tipo burguês que busca de modo exclusivo o lucro em tudo o que faz. Em suma, tem-se um representante da chamada 'Bildungsbürgertum' (burguesia da cultura) e outro da 'Besitzbürgertum' (burguesia da propriedade), respectivamente. Este último, a propósito, tem suas raízes literárias na figua de Crusoé, cuja popularidade perdura até os dias de hoje. Desse modo, este trabalho busca apresentar de que modo as transformações sociais ocorridas no século XVIII impactaram na tradição literária, representada por meio de dois nomes exponenciais da narrativa de ficção envolvendo formação individual e deslocamento geográfico, contribuindo para uma discussão a respeito do individualismo econômico. Para tanto, buscou-se o aporte teórico de autores como Franco Moretti (2014), Benedict Anderson (2008), Walter Benjamin (2012), Georg Lukács (2009), Thomas Mann (2011) e Ian Watt (2010), que aponta a referida obra de Defoe como responsável por iniciar a tradição do romance como gênero.
Drei französische Romane der 70er Jahre von Robert Merle, Raymond Jean und Pascal Lainé stehen im Zentrum des Beitrags von Luís Gonçalves. Die Bemühungen um das theoretische Werk Marx' - so seine Analyse - bleiben dabei deutlich hinter dem Wunsch, sich selbst zu befreien, zurück. Die theoretischen Gewährsmänner dieser Bewegung waren nicht die Klassiker des Sozialismus, sonder eher Wilhelm Reich und Guy Debord.
Den deutschen Linksterrorismus der RAF und ihre gesellschaftlichen Folgen behandelt Gerald Bär anhand der Filme "Deutschland im Herbst" und "Der Baader Meinhof Komplex", berücksichtigt wird dabei auch die Aufnahme dieser Ereignisse in Portugal, so wie das Lied "Sedas a Vento", das Vitorino Salomé der toten Ulrike Meinhof widmete.
O cotidiano nas salas de aula de ALE nos contextos universitário e institucional extracurricular - como é o caso do projeto PALEP - Projeto Aulas de Línguas em Espaços Públicos (UERJ/UFRJ) – tem imposto desafios de várias ordens a todos os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Consideramos como pressuposto da pesquisa a ideia de que professores e gestores da ensino-aprendizagem estão diante de salas de aula de natureza "multinível" e que o reconhecimento dessa natureza tem implicações político-pedagógicas que terão reflexo no papel de alunos e professores, no desenvolvimento do material didático e também nos objetivos do processo de aprendizagem. O objetivo deste artigo é, portanto, discutir aspectos teóricos da atividade de ensino-aprendizagem como uma atividade complexa e identificar três dimensões do reconhecimento da natureza "multinível" das salas de aula de ALE: a dimensão social, que engloba questões relacionadas às possibilidades de socialização e cooperação levando em conta a multiplicidade de níveis em sala de aula; a dimensão pedagógica, que impõe transformações na racionalidade didática em sala; e, por fim, a dimensão política, que nos permite compreender melhor processos de produção do fracasso e de evasão em cursos de ALE.
Este artigo se propõe a discutir algumas questões de interesse tradutológico referentes às três traduções brasileiras (1950; 1977; 2017) da obra Der Witz und seine Beziehung zum Unbewussten, de Sigmund Freud - cuja primeira publicação data de 1905. Parte-se de argumentos expostos em um debate entre o poeta e tradutor brasileiro Haroldo de Campos e o tradutor francês de Freud, Jean Laplanche, acerca das possibilidades de traduzir os chistes citados por Freud no referido livro, para identificar as diferentes estratégias adotadas pelos tradutores brasileiros. Longe de apresentar uma análise completa das diversas versões ou um cotejo exaustivo entre o original e as três (re)traduções, o que este trabalho visa é defender que elas constituem aproximações diferentes – porém todas válidas e potencialmente relevantes para o leitor-alvo - em relação a determinados aspectos da obra "original".
Uma análise de O tambor de Günter Grass : recursos ficcionais para debater sua própria história
(2018)
Busca-se neste artigo analisar os recursos ficcionais utilizados pelo escritor Günter Grass em sua obra literária mais famosa, O tambor, na qual o autor recria, através do protagonista, Oskar Matzerath, sua própria história. Para tanto, o artigo coteja a obra de ficção O tambor com a autobiografia do autor alemão, juntamente com os percalços de sua trajetória pessoal.
Die Zeitschrift Pandaemonium Germanicum erscheint zweimal jährlich und versteht sich als Forum für die wissenschaftliche Diskussion in den verschiedenen Bereichen der internationalen Germanistik, nämlich der Literatur- und Übersetzungswissenschaft, Linguistik, DaF und Kulturstudien. Die Zeitschrift wird von der deutschen Abteilung der FFLCH-USP (Universität São Paulo) seit 1997 herausgegeben und will zur Verbreitung unveröffentlichter Forschungen von GermanistInnen aus Brasilien und anderen Ländern, sowie zur Förderung des Dialogs zwischen der Germanistik und anderen Wissensbereichen beitragen.
Contestando a suposta superação do mito na modernidade e a validade da dicotomia entre mito e logos, este artigo propõe aproximações entre as categorias do pensamento mítico enumeradas por Ernst Cassirer e a obra de Walter Benjamin, aqui representada especialmente pelos textos de juventude do autor que compõem sua filosofia da linguagem. De maneira mais pontual, recorrer-se-á, ademais, a outros ensaios e livros de sua obra, intencionando sugerir a abundância de material do pensador como um campo profícuo para o estudo do mito.
Em 2017, completaram-se os trinta anos do lançamento de Patmos e outros poemas de Hölderlin, primeiro livro de poesia traduzida assinado por Marco Lucchesi. O então jovem poeta percorre uma amostra da lírica de Friedrich Hölderlin por meio da tradução, enquanto experimenta a própria poesia e nos remete à concepção benjaminiana de Erfahrung [experiência], que, como observa Jeanne-Marie Gagnebin, entre outros, "[...] vem do radical fahr-, usado ainda no antigo alemão no seu sentido literal de percorrer, de atravessar uma região durante uma viagem" (GAGNEBIN 1994: 66). Numa reflexão sobre os elementos que vão compondo uma poíesis diferenciada, verificamos que se desenvolve uma Erfahrung como "itinerário" para o futuro percurso de Lucchesi como poeta-tradutor. O presente trabalho propõe-se expor tal "itinerário" não com o intuito de rastrear e analisar exaustivamente as referências que se enfeixam para produzir uma rede algo caótica ou interpretar toda a poesia por vezes hermética que opera essa rede, mas de apontar como, a despeito da condição de criação indomável, numa obra espécie de colagem ou mosaico, Lucchesi lançava-se a uma tentativa de diálogo com a lírica alemã, como parte privilegiada da produção lírica ocidental de diferentes épocas.
Feridun Zaimoglu é um dos principais autores de língua alemã que introduzem a história e as experiências dos imigrantes e seus antepassados em seus textos literários. O romance Leyla, publicado em 2006, é um exemplo paradigmático disso, pois seu universo ficcional apresenta uma configuração temporal que antecede a chegada da protagonista turca à Alemanha. O presente artigo tem por objetivo discutir o romance em dois aspectos: a gênese da voz em espaços com desequilíbrio de poder e por outro lado a gênese da imagem do outro no universo pessoal dos personagens
O presente artigo tem como objetivo analisar a construção de imagens discursivas de aprendizes em sumários e em atividades contidas em livros didáticos de Alemão como Língua Estrangeira (ALE), e de que modo essas construções antecipam que tipo de inserção esse aprendiz teria de/poderia ocupar nessa comunidade de produção/circulação de textos na língua alvo. Nesse sentido, o quadro teórico se constrói a partir da articulação entre a perspectiva polifônica da linguagem (BAKHTIN 2011), a noção de práticas discursivas (FOUCAULT 2004; MAINGUENEAU 2008) e o disciplinamento de saberes (FOUCAULT 2002), considerando a relevância de tal articulação para uma crítica à Linguística Aplicada a partir de Rocha e Daher (2015). Por meio das análises de livros didáticos de ALE, observamos a construção de imagens de aprendiz que parece retirá-lo das situações de interação, considerando-o mero espectador, que se ocupará de repetir sentenças e estruturas determinadas por uma simulação artificial de situações comunicativas, mais do que permitir a ele espaços de interação e de inserção nessas situações. Além disso, os materiais comunicam uma imagem de aprendiz-consumidor-turista, interessado em aprender a língua para fazer viagens, realidade essa distante da brasileira.
Die Zeitschrift Pandaemonium Germanicum erscheint zweimal jährlich und versteht sich als Forum für die wissenschaftliche Diskussion in den verschiedenen Bereichen der internationalen Germanistik, nämlich der Literatur- und Übersetzungswissenschaft, Linguistik, DaF und Kulturstudien. Die Zeitschrift wird von der deutschen Abteilung der FFLCH-USP (Universität São Paulo) seit 1997 herausgegeben und will zur Verbreitung unveröffentlichter Forschungen von GermanistInnen aus Brasilien und anderen Ländern, sowie zur Förderung des Dialogs zwischen der Germanistik und anderen Wissensbereichen beitragen.
Este artigo aborda parte dos resultados de uma pesquisa mais abrangente que objetivou compreender (inter)relações que se estabelecem entre práticas de leitura e escrita em alemão e em português de crianças do Ensino Fundamental e o contexto de língua de herança em que estão inseridas. Quanto à dimensão teórica, o estudo filia-se à área da Linguística Aplicada em diálogo com a Educação em contextos interculturais. A pesquisa, de base qualitativo-interpretativista, teve como locus uma escola municipal, em zona rural do município de Blumenau, Santa Catarina. Quanto aos procedimentos metodológicos, foram utilizadas duas propostas de produção de narrativas escritas, uma em português e outra em alemão. Os resultados sugerem que (i) as crianças têm domínio restrito de uma estrutura narrativa e aplicam-na parcialmente nas produções em ambas as línguas; (ii) o vocabulário e as estruturas gramaticais são característicos das práticas linguageiras cotidianas; iii) os estudantes desconhecem ou não internalizaram regras ortográficas, especialmente da língua alemã. A partir dos resultados da pesquisa afirma-se a importância de se garantir, na educação formal, o aprendizado da língua de herança, ao lado do português, em contextos bi/multilíngues similares.
Este trabalho analisa a língua alemã como marcador de identidade étnica teuto-brasileira na cidade de Pomerode (SC) entre a década de 1980 e os dias atuais através de histórias de vida, isto é, de relatos que os teuto-brasileiros fizeram de sua vida pessoal e social. Para essa compreensão investiga-se os sentidos atribuídos pelos depoentes à lingua no que diz respeito ao seu aspecto objetivo e subjetivo. A pesquisa encontra-se apoiada na teoria da etnicidade relacional e em estudos sobre identidade étnico-cultural e na metodologia de História Oral. A língua alemã em Pomerode é, de um lado, vivenciada individualmente e, de outro lado, compartilhada no coletivo étnico e está relacionada à produção de sentidos que cada depoente vivenciou na família e na comunidade étnica, o que caracteriza permanência e transformação do papel dessa língua e uma negociação de sentidos individuais e coletivos. A redefinição do papel da língua alemã em Pomerode está associada, por um lado, ao próprio grupo étnico, ou seja, a autocompreensão de sua identidade étnica e, por outro lado, à mercantilização da identidade, ou seja, à instrumentalização da língua.
Os seriados televisivos vêm se destacando como opção de lazer bastante recorrente entre pessoas de diferentes faixas etárias, em especial, dentre estudantes. Diante disso, este trabalho tem como objetivo abordar as vantagens do uso de tal material para o ensino de aspectos linguísticos, político-sociais, ideológicos e socioculturais de língua alemã. Trata-se do recorte de uma pesquisa que se encontra ainda em desenvolvimento, no qual destacaremos o seriado Deutschland 83. Ressaltaremos a importância do uso de materiais autênticos para o ensino de línguas e a necessidade do ensino com foco em aspectos da cultura estrangeira. Concluímos que o seriado Deutschland 83 é um material com potencial a ser explorado, permitindo que o aprendiz se aproxime da cultura e língua alemã, ao mesmo tempo em que proporciona ao aluno material para gerar uma reflexão sobre sua própria realidade.
As obras visuais de Carlfriedrich Claus e de Ana Hatherly se localizam fora daquilo que se convencionou chamar de poesia. Uma poesia sem palavras resta como impossibilidade para os defensores da prática logocêntrica da escrita. Os autores aqui estudados suscitam, portanto, uma leitura desviante da atividade poética contemporânea. Eles defendem a hipótese de que a poesia contemporânea tende à iconicidade e mesmo da completa ilegibilidade como modo de apreensão estética de um mundo caótico. Porque não se constituem e nem podem ser lidos a partir das mesmas regras da lírica tradicional, os textos deliberadamente obliterados desses poetas resultam na transformação inequívoca dos métodos de criação e leitura, não obstante a resistência de certos ramos da crítica